poesia
Quatro poemas para ser estrangeiro [inéditos]
Virgínia Boechat
LISBOA OU 2010
esse
jeito de bater
o corte
mal fechado no dedo
a
cidade por dentro de um peito
quem
vai entender
quem
vai entender essa rua
cortada
no peito da cidade
não
mexe
olha do
miradouro
sem
amor
sem
amor quem vai entender
ladeira
sem taxi desejo retalhado
pele
cor de areia degrau que pulsa
num
corte da fala
não
tenta mexer
nem
esbarra em ninguém
não
deixa que abram de novo essa rua
a
cidade lá dentro acende à noite
ninguém
vai entender
CONTEMPLAÇÃO DO QUADRO
Budapeste
tem quatro cantos
para os
soluços de desespero
e para
quebrar-se a si mesmo
em
pontos vermelhos
depois
mais chá
para o
medo mais apaixonado
tem
quatro bordas Budapeste
para um
barco cair do mundo
quando
olhar o branco não mais
é a
mesma parede é a mesma
sala é
a mesma praça
onde
alguém jura que viu amoreiras
vertical
Budapeste ignora
em
preto cruza o som das crianças ao longe
sem
traço de fala
PORMENOR
olha
bem aqueles fios
quase
um nó muito pequeno
e de
vestido vermelho quase
um
ponto no canto da praia
uma
praia num canto da casa
nenhuma
e nenhum sopro
desmancha
as tranças
enquanto
corre ri e faz contas
numa
infância de tinta
como
todas são como a minha
no
vento do parque das mangabeiras
mas
olha bem que é tênue e escapa
a faixa
de areia onde ela brinca
e pula
e pisa e dispersa as poças
que
paradas mostrariam casas
e ela
sendo Clarisse, Maria, Leonor e Lia
a
reconheceremos ao lado
de
durar e o mar talvez
talvez
o mar ali sejamos nós
METROPOLITANO
Fica a
poeta na estação
dois
azulejos sua pintura o olhar baixo
a
estação por trás do vidro
o vidro
por dentro da terra
terra
dela dentro
onde
fica
a
estação aos poucos
e o
vagão a terra adentro
traça
de ponta a ponta
o
metropolitano vazio
Virgínia Boechat nasceu em Belo
Horizonte em 1977 e mora atualmente em São Paulo, onde é pesquisadora na área
de literatura portuguesa. Publicou o livro de poemas Prelúdio para arco e flecha (Oficina Raquel, 2008). Entre 2009 e
2010 viveu por seis meses em Portugal.
[revista dEsEnrEdoS - ISSN 2175-3903 - ano III - número
8 - teresina - piauí - janeiro fevereiro março de 2011]